O esboço da declaração da Rio+20 aprovado pelos negociadores saiu como
esperado. É fraco. Foi considerado sem ambição até pelo Secretário
Geral da ONU, Ban Ki-moon.
Está bem claro que os chefes de Estado coletivamente não vão nos
salvar, pois os mecanismos da ONU são muito aquém do necessário para
resolver problemas complexos. Ademais, a falta de liderança dos governos
é evidente na crise financeira global. Eles não têm conseguido
resolver nem aquilo que eles supostamente se interessam mais: a
economia tradicional.
Então, a Rio+20 foi um fracasso total? Talvez não. Provavelmente o
significado das grandes conferências ambientais recentes (como as sobre
mudanças climáticas) vai depender muito do que nós, eleitores e
consumidores, fizermos daqui para frente.
A preparação para as grandes conferências tem envolvido alguns
movimentos relevantes. Primeiro, cientistas, empresários, funcionários
públicos e organizações sociais se esforçam para fazer sínteses dos
problemas e soluções. Nas conferências, estes resultados são promovidos e
debatidos.
Segundo, os diversos atores aproveitam as conferências para lançarem
iniciativas e compromissos de sustentabilidade. Alguns exemplos do que
presenciei e li nos últimos dias são promissores:
- O prefeito do Rio de Janeiro propôs a isenção de impostos municipais para construções que adotem medidas para reduzir consume de água e energia. A bola está agora com a Câmara de Vereadores;
- O governador do Pará se comprometeu a zerar o desmatamento até 2020;
- Os prefeitos das 59 maiores cidades do mundo (agrupadas na iniciativa C40) se comprometeram a reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em cerca de 1,3 bilhão de toneladas até 2030;
- O Banco Central vai disponibilizar para consulta pública duas normas sobre a política de responsabilidade socioambiental e sobre a elaboração e divulgação de relatório de responsabilidade socioambiental por parte das instituições financeiras;
- O Conselho Empresarial da América Latina propôs isentar de impostos as empresas que produzem energia renovável;
- O Conselho do Fórum de Bens de Consumo, que reúne as grandes multinacionais deste setor, anunciou o compromisso de eliminar o desmatamento de sua cadeia de suprimento até 2020. Ou seja, empresas como Unilever, Walmart, Tesco (rede de supermercados britânica) boicotarão soja, óleo de dendê, carne e celulose e seus derivados de áreas que contribuam para o desmatamento.
Esses e outros compromissos são confiáveis e suficientes? Certamente
algumas das promessas fazem parte da maquiagem verde que visa a esconder
problemas, mas outras são genuínas. A pressão social e legal tem feito
algumas empresas e governantes entenderem que é inaceitável continuar
práticas destrutivas. Além do mais, muitas empresas sabem que só será
viável crescer aumentando a eficiência. Já consumimos hoje mais do que o
planeta pode aguentar.
Todas as iniciativas prometidas na Rio+20 são insuficientes, mas elas
podem criar o impulso para uma transformação mais ampla. O diretor geral
da Unilever, Paul Polman, que é do Fórum de Bens de Consumo, resumiu
bem o processo em entrevista ao jornal The Guardian:
"Nos próximos dois ou três anos, acredito que haverá suficiente massa
crítica com grupos de países e empresas começando projetos concretos.
Como em muitos programas de mudança, quando você cria algum sucesso em
torno de algum projeto concreto específico, isto atrai outros. Existem
líderes, seguidores e retardatários em tudo."
Enfim, creio que ainda é cedo para fazer o balanço da Rio+20. Se
apoiarmos e cobrarmos as mudanças planejadas e prometidas talvez se
atinja massa crítica para um desenvolvimento mais sustentável em escala
global.
Cada um pode fazer a sua parte, como nos exemplos abaixo:
- Jornalistas poderiam fazer uma lista destes compromissos e sistematicamente cobrir o desempenho das empresas e governos. Em vez de esperar a divulgação de novo recorde de desmatamento para tratar deste tema, a cada semestre algum jornalista pode perguntar ao diretor do Walmart no Brasil como anda a implementação do plano para evitar a compra de gado de áreas desmatadas ilegalmente.
- Estudantes universitários podem comparar a lista de compromissos com os relatórios de responsabilidade social das empresas ou outros indicadores de desempenho relevante de cada compromisso como as emissões de gases do efeito estufa, a taxa de desmatamento, ou o financiamento para economia verde no caso dos bancos.
- Indivíduos e ONGs poderiam lançar campanhas nas redes sociais na internet para parabenizar ou criticar o desempenho dos compromissos.
- Devemos demandar que o Congresso aprove a desoneração da energia renovável.
*Paulo Barreto é pesquisador sênior
do Imazon, com graduação em Engenharia Florestal pela Universidade
Federal Rural da Amazônia (Ufra) e Mestre em Ciências Florestais pela
Universidade Yale, dos Estados Unidos. Fonte: O Eco |
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