A proporção de bicicletas e habitantes hoje é bastante favorável em Berlim
Berlim - No começo do século, os sininhos das bicicletas
faziam parte da trilha sonora permanente de Berlim. Na década de 1950, a
proliferação dos automóveis relegou as ‘magrelas’ às crianças e aos
pobres. Com o planejamento da cidade e do tráfego em outro rumo, pedalar
saiu de moda, além de não ser algo lá muito seguro.
A queda do Muro de Berlim em 1989 acabou ajudando a derrubar o
preconceito e a pavimentar um novo caminho para os ciclistas e toda
forma de transporte mais saudável e ecologicamente correto.
O resultado é que, nos dias de hoje, pedalar tornou-se “chique”, e a
bicicleta foi incorporada pelas políticas públicas, que dão preferência a
um transporte que, em troca, ajuda a cidade a ser mais limpa,
silenciosa e menos engarrafada. No momento em que políticas sustentáveis
são discutidas no mundo todo, com destaque para a Rio+20, no Rio de
Janeiro, nos dias 20, 21 e 22 deste mês, o exemplo de Berlim parece
inspirador.
A proporção de bicicletas e habitantes hoje é bastante favorável em
Berlim. Para cada mil habitantes há 720 bicicletas e apenas 320 carros.
Ou seja, os 3,5 millhões de habitantes movimentam 2,5 milhões de
bicicletas. A cidade se preparou para que isso fosse progressivamente se
tornando uma tendência. Mais de mil quilômetros de ciclovias atravessam
a cidade e, recentemente, passaram a ser investidos 5,5 milhões de
euros todos os anos na manutenção e no saneamento das ruas de Berlim,
para permitir que os ciclistas pedalem com segurança e conforto.
Segundo o secretário de Desenvolvimento Urbano e Meio Ambiente do
estado do Berlim, Christian Gaebler, o objetivo é investir nos próximos
anos cerca de 17 milhões de euros por ano. O governo berlinense quer
chegar em 2025 com 18% a 20% de todas as ruas da cidade com ciclovias.
Segundo o ADFC (Associacao alemã de ciclistas), atualmente são 15% de
vias próprias para os ciclistas – até meados dos anos 1990, as ciclovias
estavam em apenas 6% dos caminhos da cidade, muito mais que qualquer
cidade brasileira.
A mudança em favor dos ciclistas é um processo de ‘um pedal empurra o
outro’. E apoiar publicamente as bicicletas tornou-se interessante para
os políticos e gestores públicos. “É saudável, prática e não é cara",
resume Gaebler.
De 2000 a 2011 mais de 25 quilômetros de ciclovias foram construídas e
mais de 102 quilômetros foram riscados. A expansão impulsiona um mercado
de peças, roupas, acessórios e, claro, bicicletas. Os pedidos são
maiores do que os estoques das lojas. E alguns modelos não estão
disponíveis para pronta entrega. No ano passado, foram vendidas na
Alemanha 4 milhões de bicicletas – 2% a mais que em 2010.O que os alemães estão dispostos a investir para pedalar também mostra
que a moda é um mercado em crescimento. Em 2008 a média de investimento
em uma bicicleta era 387 euros. Atualmente a média é de 495 euros, mas a
variação de preços é imensa, e é possível escolher entre 1.600 modelos
diferentes.
A moda na Alemanha no momento é a “Porsche das bicicletas”, a
Koga-Miyata Spyker Aeroblade. Com guidão de titânio, rodas de carbono e
alumínio e um banco de couro, pesa sete quilos e 12.000 euros.
Outro modelo bastante original que circula comumente pela cidade é a
Christiania, utilizada pela escritora Frauke Niemeyer e seus filhos
Roberta e Carlo. Trata-se de uma bicicleta dinamarquesa de três rodas,
que custa de 2.000 a 5.000 euros e tem um "compartimento" na frente da
bicicleta com proteção contra chuva e neve e cintos de segurança para as
crianças.
Em seu livro "Um ano no Rio de Janeiro", a autora relata sua
surpresa em perceber que a maioria das pessoas encara a bicicleta como
meio de lazer e não como transporte na cidade da Rio+20. "Fiquei
impressionada. No Rio, quem não anda de metrô ou ônibus, prefere andar
de táxi ou de carro. A bicicleta para os cariocas é um aparelho de
ginástica”, compara.
Psicólogo e especialista em tráfego, Klaus-Peter Kalwitzki observa que o
aumento do número de ciclistas provocou uma mudança no comportamento de
pedestres e motoristas. E, na disputa por espaço nas ruas, os ciclistas
têm preferido avançar sobre os automóveis: “Há raros acidentes entre
bicicletas e pedestres, e são mais comuns as colisões com automóveis”,
explica.
Entre os percalços para os ciclistas berlinenses há ainda um produto do
mercado paralelo que a proliferação de bicicletas e consumidores gerou:
o de produtos roubados. Um “medidor” de roubos indica que a cada minuto
e meio é roubada uma bicicleta na Alemanha – ou mais de 130 mil só este
ano.
REVISTA EXAME (digital)
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